Conto um, conto dois...quantos cantos têm a mim! Conto muitos como muitos e tantas vezes e, tantas contas que nem tenho mais conta de quantos contos ainda sou! Cantamos o que damos conta, o que vemos e o que ouvimos, o que nos dizem e o que nos mostram e adiante nós seguimos como conhecedores de nós mesmos. Pedaços é o que somos e, como pedaços, precisamos ser juntados, mas o inteiro que podemos ser jamais será descoberto, difícil ser arrebanhado.

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domingo, 22 de novembro de 2015

Epokhé

um canto de Walner Mamede em 22/11/2015



Como uma farpa por sob a unha
Ou uma ferida aberta no calcanhar
E o pé enfiado em um sapato
Novo, apertado, obrigado a andar,
Caminho, mas não inteiro
Manco, em desalinho, pra não cair
Tropeço, me arrasto e me acerto
Em direção ao portão aberto,
Onde hei de poder sair.
Em fuga certa, já na soleira,
Ali, na iminência, a um passo de ir,
Me inunda o olho a imagem bendita,
Que me impede e me prende,
Um ferrolho! Maldito ferrolho!
Pixarei tuas orelhas, maldita!
Ferirei tuas ancas, feiticeira!
E, na convulsão que me estremece,
Me contorço em pranto e vômito,
Rendido, caído a teus pés,
Suspendo a decisão, em prece.
Escravo da história que eu conto?
Um ato estúpido de fé?
Amante do cárcere? Estocolmo?!
Não serei eu a descobrir.
Não hoje, não agora!
Por enquanto é o que resta,
De momento, é sua a vitória.
Não pronuncio palavra sequer,
Não as quero pronunciar,
Pois teria que cuspi-las
E a saliva em tua face,
Por demais, seria cáustica
Contaminada com o veneno
De um coração, hoje, empedernido
E que, amanhã, um novo dia,
Como mágica, já sereno,
Sangrará, em arrependimento
Por não ter sido compassivo.