Conto um, conto dois...quantos cantos têm a mim! Conto muitos como muitos e tantas vezes e, tantas contas que nem tenho mais conta de quantos contos ainda sou! Cantamos o que damos conta, o que vemos e o que ouvimos, o que nos dizem e o que nos mostram e adiante nós seguimos como conhecedores de nós mesmos. Pedaços é o que somos e, como pedaços, precisamos ser juntados, mas o inteiro que podemos ser jamais será descoberto, difícil ser arrebanhado.

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domingo, 13 de fevereiro de 2011

Homem primata

Canto criado em 1990


Homem primata
(Walner Mamede Jr.)

Hoje é dia de caça,
O animal se revela,
Mantém estendidas as garras,
Expõe as ocultas presas,
Mostra a inumanidade da razão.

Precipitado em sua busca,
Repentinamente, percebe algo.
Imobiliza-se, observa: lá está.
Movimenta-se com vagar,
Avança sorrateiro, dissimulado.
Tem nos olhos o calor da cobiça.
Ataca. Regozija-se com a vitória.

Hoje é dia de caça.
Todo dia é.

Identidade

Um canto criado em 1994


Identidade
(Walner Mamede Jr.)

Quando cheguei pr’essas banda,
Miudinho como o quê,
Me chamaro de minino
E assim foi inté eu crescê.

E, dispois, por uns treis ano
Ô um cadiquinho mais,
Uns me chamava: ô guri!
E arguns ôtro: ô rapaiz!

De chapéu e barba na cara,
Com o tempo me fiz homi,
Mas nem qui eu quisesse
Num falavam o meu nomi..

Hoje, que já tô véio,
De cabelo branco inté,
Num mi chamam de sinhô,
Mas sim de Véio José.

Janela da alma

Um canto criado em jul/2006


Janela da alma
(Walner Mamede Jr.)

Eis que, pela janela, contemplo o mundo,
Não outro, se não o meu próprio.
Por ela olho dentro de mim mesmo
E, a mim, parece confuso o lá de fora.
Seguro em meu passado
Como um navio à sua âncora
E, parado, permaneço, não vôo.
A terra correndo por sob meus pés.
Outros seguem em suas ondas,
Passado, fico olhando a janela
Como um navio que olha sua âncora.

Triste formosura

Um canto em CRIADO Abr/2006


Um canto criado em 2003

Abandono
(Walner Mamede Jr)

Seria traquinagem do Sol
Com seus raios que me cegam?!
Quem o sabe?
Não vi abandono,
Não vi brilho.
Apenas um manto
De sombras tão sepulcrais
Quanto o abismo
De minha própria alma.
Resignadamente o recebo,
Com ele me cubro,
Adormeço em mim mesmo
E, penitente, me confesso:
Não fui capaz de partir.
Agora já o sabe,
Pois aqui me quedo
Para, com meu corpo,
Buscar ao seu
E se, no encontro,
A alma de seus olhos,
Num brilho,
Se abandonar aos meus,
Saberei de pronto,
Num instante tão fugaz
Quanto despido de engano,
Que encontrei o que procuro:
A luz de meus olhos,
Até então apagada
Pelo vazio do abandono.